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quarta-feira, junho 08, 2011

PROCESSO COLABORATIVO DE ENSINO E APRENDIZAGEM NA UNIVERSIDADE: POSSIBILIDADES FORMATIVAS DA PESQUISA-AÇÃO


PROCESSO COLABORATIVO DE ENSINO E APRENDIZAGEM
NA UNIVERSIDADE: POSSIBILIDADES FORMATIVAS DA
PESQUISA-AÇÃO



Rosana Aparecida Ferreira Pontes

Universidade Católica de Santos

Eixo 2: Pesquisa em Pós-Graduação em Educação e Formação de Professores



RESUMO



Este trabalho tematiza a formação inicial de pedagogos, no curso de Pedagogia PARFOR
(Plataforma Freire). Tem por objetivo analisar possibilidades de se utilizar a pesquisa-ação
como forma de criar um espaço de interação, participação e partilha de conhecimentos, no
contexto da sala de aula na universidade. No intuito de compreender quais são essas
possibilidades, apresenta os resultados do primeiro ciclo da pesquisa-ação em andamento, bem
como as estratégias colaborativas de ensino e aprendizagem utilizadas. Nesse processo
colaborativo, os educandos, organizados em coletivo pesquisador, desempenham papéis na aula
como participantes ativos no planejamento, gestão e avaliação do processo de ensino e
aprendizagem. Concomitantemente, aprendem a refletir, pesquisar e desenvolver a criticidade,
em ciclos de ação-reflexão-ação, conforme pressupostos da pesquisa-ação. As estratégias
colaborativas foram desenvolvidas em três dimensões: discussão sobre a aula na universidade; o
ensino e aprendizagem com pesquisa; o ensino da língua portuguesa. O trabalho com a
pesquisa-ação na perspectiva formativa e como instrumento didático foi fundamentado em
Franco. Conclui com a seguinte reflexão: a pesquisa-ação tem se configurado como processo
colaborativo de produção de conhecimento para os futuros pedagogos, à medida que, de modo
participativo e interativo, tornam-se protagonistas das aulas, construindo-se como autores da sua
história e formação.



Palavras-chave: pesquisa-ação, instrumento didático, universidade.





Introdução

Este trabalho tematiza a formação inicial de pedagogos e tem por objetivo
analisar possibilidades de se utilizar a pesquisa-ação como forma de criar um espaço de
interação, participação e partilha de conhecimentos, no contexto da sala de aula na
universidade.

O trabalho aqui comunicado está sendo desenvolvido no curso de Pedagogia
PARFOR, com três turmas de 2º semestre. O curso de Pedagogia PARFOR – Plano
Nacional de Formação de Professores da Educação Básica, da Plataforma Freire – é
oriundo de convênio estabelecido entre a UNISANTOS e o MEC. Nosso compromisso,
como instituição conveniada e corpo docente, é ministrar curso superior de Pedagogia
gratuito e de qualidade a professores em exercício nas escolas públicas sem formação


adequada à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN, de dezembro de
1996.

Assumi as aulas da disciplina de Instrumentação da Língua Portuguesa, na
função de professora pesquisadora formadora, como bolsista CAPES. Imbuída dessa
responsabilidade, organizei meu plano de ensino, bem como as estratégias formativas
em sala de aula, a partir de meus estudos sobre pesquisa-ação e autoria pedagógica.

A convergência entre a metodologia da pesquisa-ação e o desenvolvimento da
autoria docente tem sido meu objeto de estudo desde minha dissertação de mestrado
(Pontes, 2007); em trabalhos apresentados (Pontes, 2008, 2010); e no grupo de pesquisa
Práticas pedagógicas: pesquisa e formação, na UNISANTOS, do qual participo. O
grupo tem se preocupado em aprofundar as possibilidades da pesquisa-ação como
instrumento de formação docente.

A relação que estabeleço entre pesquisa-ação e autoria pedagógica tem por
esteio o fato de que as origens da pesquisa-ação no Brasil estão fortemente entrelaçadas
com a ação educativa. Sua principal influência encontra-se nos trabalhos de Paulo Freire
relativos à educação popular. O método de alfabetização, a partir da leitura do
alfabetizando de seu próprio contexto sócio-histórico é que proporcionou as bases da
pesquisa participante e influenciou a pesquisa-ação como é pensada no Brasil. Assim,
conforme conceitua Brandão (2006, p. 13): “Uma pesquisa que é também uma
pedagogia que entrelaça atores-autores e que é um aprendizado no qual, mesmo quando
haja diferenças essenciais de saberes, todos aprendem uns com os outros e através dos
outros”.

Neste trabalho, assim como nos estudos que tenho desenvolvido, o professor
autor é compreendido como um profissional reflexivo, autônomo e pesquisador da
própria prática, de acordo com referencial teórico que propõe um novo perfil para a
formação docente (Schön, 2000; Zeichner, 1998; Alarcão, 2003).

Na sala de aula da universidade, portanto, busco desenvolver habilidades de
autoria, reflexão e pesquisa da prática na perspectiva do trabalho coletivo entre os
educandos, em diálogos com seus pares, conforme Freire (2005) e Franco (2003). A
pesquisa-ação surge, então, como uma forma de articular pesquisa e formação em
âmbito coletivo.

O presente texto se organiza a partir da seguinte problemática: quais as
possibilidades de se utilizar a pesquisa-ação, sob uma perspectiva formativa, de modo a


criar um espaço de interação, participação e partilha de conhecimentos, no contexto da
sala de aula na Universidade?

Apresento, a seguir, os pressupostos teóricos que fundamentam a pesquisa-
ação em andamento, as estratégias colaborativas de ensino e aprendizagem utilizadas,
bem como os resultados do primeiro ciclo do trabalho que compreendeu o primeiro
semestre letivo do curso de Pedagogia PARFOR, de setembro a dezembro de 2010.
Concluo refletindo como a pesquisa-ação tem se configurado em processo formativo e
colaborativo de construção de autoria para os futuros pedagogos.



Pressupostos teórico-formativos da pesquisa-ação

Como base teórica nuclear, adoto a perspectiva formativa que a pesquisa-ação
pode assumir na formação de professores, conforme os estudos de Franco (2003, 2005,
2009).

Na perspectiva defendida pela autora, destaco os fundamentos epistemológicos
(Franco, 2003) que servem de esteio para esta pesquisa, quais sejam: a) a integração
dos sujeitos da práxis – quando pesquisador e sujeitos participantes tornam-se parceiros
e produtores do processo de transformação da prática e de autoformação; b) objetivo
formativo e emancipatório aos sujeitos da práxis – quando pesquisadores e
participantes desenvolvem a compreensão crítico-reflexiva dos contextos e das
configurações da prática, a fim de compreenderem e superarem dialeticamente as
opressões impostas à sua existência. c) autodeterminação dos sujeitos da prática – o
sujeito se autodetermina quando se apropria do processo de construção da sua
identidade, por meio do aprofundamento das reflexões sobre sua formação docente.

Esses pressupostos contemplam os objetivos perseguidos por esta pesquisa,
assim como o conceito de autoria pedagógica que perpassa o estudo. Em sala de aula,
priorizo o trabalho coletivo pautado na reflexão crítica, incentivando os pedagogos em
formação a se autodeterminarem autores de sua formação.

Em busca de mais subsídios para o trabalho didático com a pesquisa-ação,
fundamento-me na proposta de Franco (2009), segundo a qual a pesquisa-ação pode ser
utilizada como instrumento didático para construção coletiva de conhecimentos na sala
de aula da universidade.

Franco (2009) explica que um trabalho com esse propósito precisa adotar como
objetivos:

a) produzir e socializar conhecimentos entre alunos e professores;



b) gerar transformações nas práticas docentes e discentes;
c) garantir melhores resultados para o processo de ensino e de
aprendizagem. (p. 53)




Desse modo, busca-se a superação da concepção de ensino tradicional em que o
professor é o transmissor de conhecimentos e os alunos receptores passivos, assim como
da visão reducionista de Didática como conjunto de técnicas a serem aplicadas.

Utilizar a pesquisa-ação como instrumento didático significa alcançar uma
dimensão maior de ensino e aprendizagem, qual seja a dimensão da ação-reflexão-ação
em que professor e alunos se assumem como coletivo pesquisador e passam a
compartilhar responsabilidades e compromissos.

Sob essa perspectiva, a pergunta que passará a nortear a prática docente será “o
que eu e meus alunos produziremos juntos?”, evitando, assim, a lógica centralizadora de
“o que eu vou dar em minhas aulas?”.

Fundamento-me, também, em Kenneth Zeichner (1998). O autor americano
considera que, no âmbito da pesquisa-ação, a análise do contexto social e político seja
fundamental para a eliminação das desigualdades e injustiças sociais presentes na escola
e na sociedade. Para o autor, o principal desafio dos formadores de professores é ajudar
os alunos em formação a desenvolver a disposição e as habilidades para enxergar as
conexões entre a sala de aula e o contexto social e político nos quais ela se insere
(ibidem). Assim, na pesquisa-ação, os professores investigam suas estratégias de ensino,
a organização e gestão da sala de aula, as condições sociais de seu trabalho e o contexto
social, econômico, político e cultural em que estão inseridos, em busca de uma
perspectiva multicultural. Acredito, conforme Zeichner (1998), que quando os
professores refletem sobre suas atividades, criam saberes, ou seja, teorizam, mantendo
propriedade sobre os conhecimentos por eles gerados.

Como pressuposto, esta pesquisa considerou, ainda, que a pesquisa-ação
utilizada como instrumento didático na universidade pode favorecer o desenvolvimento
da autoria pedagógica (Pontes, 2007), ou seja, da capacidade do docente de criar as
atividades pedagógicas, avaliando continuamente de forma crítica o próprio trabalho. É
possível, portanto, proporcionar condições para que os pedagogos em formação no
PARFOR estabeleçam relações entre a teoria que estão aprendendo na universidade e a
prática docente que exercem, construindo-se, nesse processo, como autores de seu fazer
pedagógico.




O processo formativo e colaborativo da pesquisa-ação

Franco (2009) indica fases para o trabalho didático com a pesquisa-ação, tais
como: 1. esclarecimento do projeto de pesquisa partilhado; 2. oficinas de produção; 3.
as sínteses coletivas; 4. socialização entre o coletivo pesquisador da produção de todos;
5. produção individual dos conhecimentos adquiridos no processo. Passo, então, a
identificar no primeiro ciclo desta pesquisa quais fases foram possíveis realizar.

O início de uma pesquisa-ação com fins formativos (Franco, 2009, p. 33) se dá
com a “construção da dinâmica do coletivo”, ou seja, a “construção coletiva do nós”, do
grupo, do momento em que acontece a integração dos sujeitos da práxis – pesquisador e
demais sujeitos da pesquisa. É preciso, para tanto, justificar ao grupo as finalidades da
pesquisa, situar-se como pesquisador, sensibilizar os participantes para a cultura da
colaboração. É o momento para o estabelecimento de um “contrato de ação coletiva”,
em que os participantes assumem compromissos partilhados. Trata-se da primeira fase
indicada acima pela autora.

Considero que essa fase não aconteceu em um momento estanque, mas sim ao
longo do primeiro semestre do curso. Por meio de estratégias colaborativas de ensino e
aprendizagem fui envolvendo os participantes no processo cíclico de ação-reflexão-ação
da pesquisa-ação, e, aos poucos, os alunos foram tomando consciência que faziam parte
de um coletivo pesquisador com responsabilidades compartilhadas.

Como “contrato de intenções coletivas”, apresentei meu plano de ensino do
primeiro semestre, estabelecendo como um dos objetivos principais trabalhar sob a
lógica da pesquisa-ação. Justifiquei ao grupo minhas intenções, explicando que a partir
daquele momento a responsabilidade de realizar o plano passava a ser coletiva.
Periodicamente, durante as aulas, realizamos a avaliação do plano e, de modo coletivo,
algumas ações foram reconduzidas e o plano para o segundo semestre já incorporou as
sugestões do grupo. Assim, houve a construção coletiva do “contrato”, os alunos foram
compreendendo melhor o processo, e o plano de ensino, conforme sugere Franco
(2009), transformou-se em um projeto de pesquisa coletivo. Assumimos, então, os
objetivos de trabalhar o ensino dos conteúdos com pesquisa e de realizáramos análises
dos diferentes aspectos que envolviam a aula na universidade e o trabalho coletivo entre
alunos e entre professora e alunos.

Essa sistemática possibilitou, também, conforme Barbier (2004), um efeito
recursivo. Isto é, à medida que se avança em pesquisa-ação sempre há uma retomada e
possível reformulação das ações em virtude da reflexão permanente sobre a ação. Isso


caracteriza um dos princípios fundantes dessa metodologia de pesquisa, qual seja: a
abordagem em espiral.

Franco (2005) esclarece que as espirais cíclicas – ou a permanente reflexão
sobre a ação em um processo coletivo – são a essência do trabalho eminentemente
pedagógico em pesquisa-ação, abrindo espaços para que se formem sujeitos
pesquisadores. A autora considera que as espirais cíclicas exercem funções
fundamentais na pesquisa-ação, tais como:

Instrumento de reflexão/avaliação das etapas do processo; instrumento
de autoformação e formação coletiva dos sujeitos; instrumento de
amadurecimento e potencialização das apreensões individuais e
coletivas; instrumento de articulação entre pesquisa/ação/reflexão e
formação. (FRANCO, 2005, p. 498)



Para a construção da dinâmica do coletivo e de um trabalho em espiral, fez-se
necessária a criação de estratégias colaborativas. Estratégias essas que promoveram a
integração dos grupos-classe e, ao mesmo tempo, configuraram-se em ações
pesquisadoras na aula e sobre a aula, a fim de ajudá-los a refletir sobre a prática docente
e assumir-se como coletivo pesquisador, co-responsáveis por sua formação.

As estratégias atingiram três dimensões: discussão sobre a aula na
universidade; o ensino com pesquisa; o ensino da língua portuguesa.



Sobre a dimensão da aula na universidade

Com a finalidade de que o aluno tivesse a oportunidade de atuar como
protagonista do seu processo de construção de conhecimento, desenvolvi estratégias
colaborativas que oportunizaram momentos de ação e reflexão na aula e sobre a aula.
Apoiei-me no conceito de “ensinagem” proposto por Anastasiou e Alves (2003).
Segundo as autoras, a ação de ensinar vai além da exposição de conteúdos, sem a
garantia de que esses conteúdos sejam realmente apreendidos pelos alunos. Recorre-se,
então, a estratégias de “ensinagem” – ensino e aprendizagem – como forma de explicitar
os conteúdos.

Nessa perspectiva, os alunos foram subdivididos em grupos com tarefas
definidas em cada aula. Essas tarefas envolveram atividades de abertura da aula, de
elaboração de relatos reflexivos, de avaliação da aula e de apoio aos colegas.

Considero essas estratégias como “oficinas de produção”, conforme indica
Franco (2009) para uma segunda fase do trabalho didático com a pesquisa-ação. Essa
produção “tanto pode ser de coleta de dados; de análise de dados; de socialização de


dados; de expressão da compreensão de dados; da produção operacional de dados” (p.
59).

A princípio, essas estratégias não foram bem compreendidas pelos alunos. No
entanto, com o desenrolar das aulas, o comprometimento e empenho foram crescendo e,
realmente, as estratégias se converteram em espaço de interação, participação, partilha
de conhecimentos e de coleta de dados.

A tarefa de abertura da aula está fundamentada nos jogos e dinâmicas de grupo
(Yozo, 1996) para “quebrar o gelo”, promover a interação e criar um clima positivo para
iniciar a aula. São atividades que envolvem ação e reflexão. Servem para unir o grupo
desde o início da aula, ajudando os participantes a superar a timidez e o medo de se
expressar. Os alunos se soltam, aquecem, descarregam as tensões físicas e superam
reservas pessoais.

A cada aula, os grupos responsáveis por essa tarefa demonstraram criatividade
e melhor desempenho, motivando os colegas. Por iniciativa própria, trouxeram para
esse momento atividades como músicas e jogos que utilizavam em sala de aula com
seus alunos. Proporcionaram-se, assim, troca de conhecimentos, aprendizado e
experiências. Essa estratégia ajudou, também, a sensibilizar e envolver o grupo para a
formação do coletivo pesquisador

Preparar o relato reflexivo da aula significou compreender que a aula foi
preparada com uma sequência didática (Zabala, 1998), ou seja, envolveu um conjunto
de atividades ligadas entre si, planejadas para ensinar um conteúdo, etapa por etapa. As
sequências didáticas são organizadas de acordo com os objetivos que o professor quer
alcançar com seus alunos, elas envolvem atividades de aprendizagem e avaliação. Os
grupos elaboraram registros primorosos, captando todos os detalhes da aula. Os relatos
foram, a princípio, compartilhados via e.mail com os demais colegas. Isso facilitou a
compreensão dos conteúdos para todos, à medida que eram reapresentados de forma
escrita e reflexiva pelos próprios alunos.

Essa atividade caracterizou-se como um “diário de bordo”, instrumento
reflexivo utilizado por pesquisadores e amplamente recomendado (Alarcão, 2003) para
a formação de professores pesquisadores e reflexivos. Busquei com essa estratégia
desenvolver o registro como prática de autoria (Pontes, 2007), pois à medida que o
aluno escreve explicando e se explicando, apropria-se de novos conhecimentos e
desenvolve a capacidade de síntese.


A avaliação da aula, a princípio, consistia em uma sondagem das expectativas
dos alunos sobre o aprendizado em relação à disciplina. Com o decorrer da pesquisa, os
registros configuraram-se como sínteses do coletivo pesquisador. Como explica Franco
(2009, p. 60), para uma terceira fase do trabalho didático com a pesquisa-ação, é preciso
construir com o grupo “sínteses, sempre provisórias, mas coletivas e coletivizadas”.
Essas sínteses precisam abranger vários planos de análise, tais como o conteúdo, os
dados, o sujeito aluno, o sujeito pesquisador, o papel de cada um como parte de coletivo
pesquisador.

As reflexões coletivas ajudaram-me a reformular meu Plano de Ensino, bem
como a conduzir e reconduzir as atividades pedagógicas. As avaliações elaboradas pelos
grupos foram compartilhadas com todos os alunos que, por sua vez, podiam incluir suas
críticas e sugestões. Desse modo, acredito que o grupo foi instigado pelo movimento
das espirais cíclicas a “ir e voltar ao mesmo ponto, cada vez com mais profundidade,
cada vez com mais olhares”. (FRANCO, 2009, p. 60)

Esses registros iniciais já demonstraram um potencial explicativo, reflexivo e
crítico sobre questões didáticas da aula e formas de compreensão dos conteúdos
ministrados, como podemos constatar por meio dos trechos extraídos das avaliações de
alguns grupos:

A aula foi informativa e a professora expôs os gêneros textuais com
clareza, dando ênfase à participação de todos e ao esclarecimento de
dúvidas. Durante a divisão dos grupos, os alunos se dispersaram,
perdendo um pouco o foco da aula, que logo após prosseguiu
normalmente. A estratégia utilizada pela professora Rosana teve
como objetivo principal a interação dos grupos. Possibilitando ao
aluno aprimorar e produzir seu próprio conhecimento. Na opinião do
grupo três, em relação às tarefas designadas, pudemos concluir que
servirão de fonte para o crescimento docente no exercício da prática.
(Avaliação do grupo 3, período vespertino, da segunda aula do
semestre passado)



A aula desenvolveu-se com atividades divididas em grupo. A
professora adotou metodologia de divisão de trabalhos em sala de
aula, como forma de elaboração de registros de aulas e outras
atividades desenvolvidas ao longo da aula. Assevera-se que havia
expectativa de conteúdo, tais como informações sobre reforma
ortográfica, gramática, para então passarmos à analise de gêneros de
texto e interpretação, em razão da heterogeneidade do grupo-classe.
Destarte, não conseguimos verificar o aproveitamento das tarefas de
divisão em grupos, tais como, aquecimento, relatos de aula, mais uma
vez, baseados no caráter e peculiaridades do grupo-classe. Vale à
pena ressaltar que as tarefas anteriormente cobradas não tiveram
esclarecimento necessário, quanto a objetivos, formatação, bem como
ao próprio conteúdo. Tendo em vista que alguns alunos não se


recordam ou desconhecem as características principais dos tipos de
gêneros textuais, no caso especifico narrativa, bem como, o
conhecimento básico de informática para envio dos trabalhos. No
mais, a característica de trabalhos em grupo é válida, podendo ser
mais bem aproveitada. Por ora, achamos que seriam necessárias
aulas expositivas com preleção dialogada, principalmente pelo
número reduzido de aulas, para melhor exploração de conteúdos e
aproveitamento do grupo-classe. (Avaliação do grupo 2, período
matutino, da segunda aula do semestre passado)



Ao abrir a possibilidade para que os alunos se expressassem abertamente, com
críticas espontâneas, acreditei na construção de uma relação de parceria e honestidade
na condução e elaboração de todas as etapas da aula. A divergência de opiniões nas
avaliações acima sobre a mesma aula levou-me a refletir que minhas instruções não
haviam sido tão claras quanto eu imaginava e, nas aulas seguintes, procurei torná-las
objetivas e retomar os conceitos de gêneros textuais, tema da aula em questão.

Outro ponto que observei foi que o grupo 2 tinha uma expectativa de aula mais
tradicional e centrada nos conteúdos. Por outro lado, minha intenção era focar a tarefa,
na perspectiva do interacionismo social (Frawley, 2000), a fim de verificar o
conhecimento prévio dos alunos sobre o tema da aula, construir hipóteses em grupo, e,
somente depois, aprofundar o entendimento com a teoria sobre gêneros textuais.
Busquei, então, esclarecer minha proposta para a classe e dosar melhor conteúdo e
tarefa, reformulando meu plano de ensino.

Quanto às tarefas de apoio aos colegas, os grupos foram lançados ao desafio de
utilizar o computador e o projetor multimídia da sala de aula; elaborar em casa textos e
mapas textuais que exigiam habilidades com o computador. Logo na primeira tarefa que
envolveu produção e envio de texto via computador, como mencionado na avaliação do
grupo 2, ficou evidente a grande dificuldade dos grupos-classe em lidar com os recursos
de informática. Muitos não tinham computador; não sabiam digitar; não tinham e.mail;
não sabiam como enviar mensagens eletrônicas; tampouco utilizar-se do ambiente
virtual de aprendizagem disponibilizado pela universidade. As dificuldades foram
compartilhadas, e uns ajudaram outros na inclusão digital. Realizamos oficinas de
informática para ensinar a formatar e enviar textos. Assim, os próprios alunos ensinaram
uns aos outros e conseguiram grandes progressos.

Na realização coletiva dessas ações pedagógicas, estão também presentes os
pressupostos epistemológicos da pesquisa-ação. À medida que os alunos se intercalaram
na execução de tarefas, ou seja, desempenharam papéis na aula, tornaram-se
participantes ativos no planejamento, gestão e avaliação do processo de ensino e


aprendizagem e, concomitantemente, aprenderam a refletir, pesquisar e desenvolver a
criticidade, em ciclos de ação-reflexão-ação. Na dinâmica do coletivo (Franco, 2003),
assumiram o papel de coletivo pesquisador, compartilhando saberes e experiências.



Na dimensão do ensino com pesquisa

As aulas foram organizadas a partir de sequências didáticas (Zabala, 1998) que
favoreceram o ensino e a aprendizagem por meio de estratégias de pesquisa.

Como exemplo, uma sequência didática que considerei relevante foi a
elaboração da caracterização dos grupos-classe pelos próprios alunos, atuando como
coletivo pesquisador e apropriando-se de técnicas para coleta e interpretação de dados.

Primeiramente, foi solicitado que os grupos coletassem dados utilizando-se de
dois instrumentos: 1. Um mapa de linha do tempo de sua trajetória de formação –
contendo os anos de nascimento de cada integrante, datas em que ingressaram no ensino
fundamental, médio, magistério e outros cursos. Tratou-se de um levantamento
quantitativo e reflexivo, colocando-os diante dos contextos históricos, sociais e políticos
que influenciaram a educação na linha de tempo que traçaram. 2. Produziram relatos
autobiográficos, narrando suas memórias sobre as experiências de alfabetização e
primeiras leituras. Segundo Alarcão (2003) e Josso (1998), as narrativas autobiográficas
são de grande valor para a formação de professores reflexivos. Com essa atividade,
busquei reconstruir com o coletivo pesquisador a trajetória de sua formação e as
experiências vividas para que refletissem sobre elas e as comparassem com as práticas
que desenvolvem atualmente, baseadas em teorias discutidas em classe, tais como:
sociointeracionismo, letramento, texto/discurso.

Após a leitura e discussão de um artigo científico, Bezerra (2010), que
explicava, teoricamente, os contextos teórico-metodológicos do ensino da língua
portuguesa, como produção final da sequência didática, elaboraram a caracterização dos
grupos-classe, em forma de relatório de pesquisa, analisando os dados quantitativos,
coletados pelo mapa da trajetória do grupo; bem como analisando de forma qualitativa
os dados coletados via narrativas autobiográficas. Usaram como fundamentação teórica
o artigo de Bezerra (2010).

Após análise dos dados, identificaram categorias de análise para quantificar e
analisar, tais como: décadas em que nasceram; origem social; idades de ingresso na
escola formal; método em que foram alfabetizados; a lei de educação que determinava a
estrutura e funcionamento do ensino na época, relação professora/aluno; influência


familiar na alfabetização; experiências de letramento; quantos cursaram o Magistério
e/ou cursos superiores.

O resultado foi surpreendente. Os grupos elaboraram bons relatórios de
pesquisa, considerando o curto tempo de aprendizado. Além de ter sido um momento
rico para trocas de experiências e reflexões, conforme avaliação dos próprios
participantes. Elaboraram gráficos para quantificar os dados e as análises foram
fundamentadas teoricamente. Conseguiram, em rodas de leitura e discussão,
compreender os contextos históricos, sociais, políticos, econômicos e culturais em que
as práticas pedagógicas estão inseridas (Zeichner, 1998). Avaliei, portanto, que essa
atividade de pesquisa, realizada pelos “grupos produtivos”, resultou em
desenvolvimento da capacidade crítico-reflexiva dos futuros pedagogos.

Considerei essa atividade em grupo como uma “oficina de produção” (Franco,
2009), um momento rico de desenvolvimento coletivo e conscientização para os alunos
que se viram como pesquisadores em ação. Puderam compreender que, no coletivo,
eram capazes de produzir conhecimento, bem como transformar todas as aulas em
espaço partilhado de estudo e pesquisa.



Na dimensão do ensino da língua portuguesa

O maior desafio enfrentado, nessa fase inicial, foi o de ajudar os alunos a
compreender que, como futuros pedagogos, nossa disciplina contemplava a
“ensinagem” da língua portuguesa, de modo que vivenciassem novas formas de
compressão e ensino dessa disciplina e as transferissem para suas práticas docentes.

Algumas reflexões dos grupos sobre as aulas começaram a demonstrar que as
expectativas de muitos alunos eram “ensino e aprendizagem” tradicionais, ou seja, que
eu ministrasse conteúdos e gramática e eles, passivamente, fizessem exercícios e provas.
Recusavam-se a entender como conteúdo os inúmeros textos estudados e produzidos,
bem como o exercício compartilhado de correção e discussão desses textos. Os grupos
vivenciaram, então, o processo de pesquisa-ação para compreender que poderiam
aprender os conteúdos de forma mais ativa e participativa, discutindo e interferindo no
planejamento e metodologia das aulas.

No início, as reflexões dos grupos sobre as aulas começaram tímidas com
elogios, até que uma aluna da tarde tomou a frente e escreveu uma reflexão com base
nos comentários paralelos e velados. Isso levantou uma verdadeira polêmica em uma


das classes. Alunas tomaram meu partido dizendo que as aulas eram produtivas e
estavam aprendendo muito, outras tiveram coragem de admitir que, realmente, sentiam
falta de conteúdo e gramática.

Criou-se um mal estar que levou à troca de vários e.mails; novas reflexões
compartilhadas; mais explicações da minha parte. Enfim, uma inflamada discussão que
colocou no âmago das questões: as aulas na universidade e o ensino da língua
portuguesa de modo tradicional, versus as novas concepções teórico-metodológicas
discutidas em classe, a partir de Bezerra (2010), bem como as estratégias colaborativas
propostas por mim.

Quebrar a insegurança e ansiedade naturais iniciais para que o trabalho se
tornasse cooperativo e solidário, e todos se sentissem seguros e se deixassem conduzir
com confiança, aconteceu gradativamente. Exigiu muita negociação e um agir
comunicativo (Franco, 2003) típicos da pesquisa-ação. Isso foi possível, também, em
virtude do envolvimento dos grupos de trabalho e das estratégias colaborativas
utilizadas.



Considerações finais

Neste trabalho, destaquei os principais resultados alcançados no primeiro ciclo
da pesquisa-ação em andamento com alunos do 2º semestre do curso de Pedagogia
PARFOR, na UNISANTOS. Apresentei, também, as estratégias colaborativas de ensino
e aprendizagem que considerei mais significativas em virtude do efeito que surtiram
sobre o desempenho dos alunos em tão curto espaço de tempo, um semestre letivo. Em
estudos anteriores (Pontes, 2007, 2010), constatei que a pesquisa-ação promove o
desenvolvimento do grupo de pesquisa com grande rapidez, em virtude do movimento
espiralado de ação-reflexão-ação que os envolve e compromete com o crescimento
coletivo. Trata-se de uma forma eficaz de trabalhar com grupos muito heterogêneos,
como é o caso dos grupos-classe envolvidos.

Utilizar estratégias reflexivas e de integração de ensino com pesquisa, com
vistas à construção da autoria do pedagogo em formação, na universidade, constitui-se
em proposta defendida por inúmeros pesquisadores. Dentre os quais, Anastasiou e
Alves (2003) propõem pressupostos para as estratégias de trabalho em aula, afirmando
que essas estratégias se articulam em torno de técnicas de ensino, as quais podem ser


compreendidas como o conjunto de processo de uma arte, maneira, jeito ou habilidade
de executar ou fazer algo (ação).

Não há estratégia infalível, nem estratégia aplicável em qualquer contexto.
Cabe, portanto, ao professor universitário explicitar e compactuar: objetivos, normas,
formas de ação, papéis, responsabilidades e resultados esperados. O objeto do trabalho
docente não está restrito a um conteúdo (ao domínio deste). Trata-se de um processo
que envolve diferentes elementos (entre eles professor e aluno) na construção de saberes
(TARDIF, 2000).

Acredito que a pesquisa-ação em andamento aqui comunicada está alinhada
com um novo paradigma de ensino, em que o professor universitário precisa
desenvolver-se como pesquisador, bem como utilizar-se de estratégias de pesquisa em
sala de aula. Como professora pesquisadora formadora, estou aplicando, na
universidade, os conhecimentos que adquiri na própria universidade. Isso considero
prática com pesquisa e em pesquisa.

O coletivo pesquisador desta pesquisa vivencia, no momento, uma segunda
etapa, no segundo semestre letivo do curso. Os alunos se sentem mais preparados e
seguros, demonstram compreender e confiar nas estratégias baseadas na pesquisa-ação.
Houve um amadurecimento e novas estratégias colaborativas estão em processo coletivo
de desenvolvimento. As discussões sobre a aula na universidade, sobre o ensino com
pesquisa, bem como sobre o ensino da língua portuguesa estão se aprofundando, rumo a
uma produção final a ser discutida e negociada coletivamente.

Identifiquei, nesse primeiro ciclo da pesquisa, que foi possível realizar as
seguintes fases para o trabalho didático com a pesquisa-ação, indicadas por Franco
(2009): 1. esclarecimento do projeto de pesquisa partilhado; 2. oficinas de produção; 3.
as sínteses coletivas; 4. socialização entre o coletivo pesquisador da produção de todos.

Constatei que essas fases não são estanques, mas se sobrepõem. Acontecem em
níveis de dificuldade e progressão maiores e menores. Enfim, acontecem seguindo um
movimento espiralado. E, como ressalta Franco (2009): “O conhecimento vai se
articulando como uma rede de construções significativas. Abrem-se espaços nas salas de
aula para diálogos, críticas e trocas”.

É preciso, portanto, coragem ao professor pesquisador. Coragem para se expor
a críticas, coragem para mudar sua atuação em sala de aula, coragem para transformar
sua prática pedagógica. Entretanto, vale a pena correr risco, porque a construção
coletiva de conhecimento em sala de aula é possível.


Finalizo afirmando que a pesquisa-ação, de caráter formativo, tem se
configurado em processo colaborativo de produção de conhecimento para os futuros
pedagogos, à medida que, de modo participativo e interativo, tornam-se protagonistas
das aulas, aprendem a refletir e a pesquisar, construindo-se como autores da sua história
e formação.



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